Rosenverck em fala no Seminario do Raça e Classe |
Em agosto de 2012 , em São Luís do Maranhão, ocorreu a "Caminhada Povo Negro” como parte da campanha eleitoral para prefeitura da capital maranhense do vice-governador Washington Luiz.
Tal caminhada demonstra o grau de degeneração que parte do movimento negro do Maranhão chegou apoiando um candidato que representa uma das mais brutais oligarquias coronelista, latifundiária e destrutiva do Brasil: que é a oligarquia Sarney e toda a sua camarilha de apoio.
Poderiam dizer que estas palavras surgem de um militante de esquerda, sectário e, portanto, com a desqualificação necessária das reflexões. Se esse é o caso não vou fazer uso de meus juízos de valores e convicções políticas e ideológicas de forma incisiva – como até acredito que deveria ser – mas, de uma série de outros interlocutores que não compartilhando necessariamente de minhas convicções caracterizam de forma sintomática o Maranhão oligárquico dos Sarney e do PT.
Inicio, porém, não com o Maranhão, mas com o Haiti. Como o “povo negro” pode marchar com um candidato que apoia um governo Federal que até tem tropas militantes no Haiti sob um regime de terrorismo de Estado, utilizando-se de força militar para favorecer os interesses mercadológicos do Imperialismo americano e das empresas brasileira. Para tanto, fazem uso da violência física, da aniquilação da liberdade de expressão, da violência simbólica e da super- exploração dos trabalhadores haitianos que recebem os salários mais baixos de toda a América. Isso num país que fez a primeira Revolução negra do continente americano e durante século foi exemplo de resistência e símbolo de medo para as elites escravocratas. Um país que mostrou para o mundo a capacidade organizativa e combativa da população negra, num contexto em que o povo negro era visto como bárbaro e incivilizado. “O povo negro” que caminhou com Washington faz coro com essa chacina que está ocorrendo no Haiti?
Como estar ao lado de um governo que tem expulsado centenas de famílias negras de seus lares, em virtude da Copa do Mundo de futebol e das Olimpíadas. Basta entrar no Google e olhar os dados. Recuso-me a fazer esse trabalho simples. Ou não é possível que o “povo negro” veja na internet num Estado como o Maranhão dos Sarneys e do PT que tem a menor rede de energia elétrica e, também, de internet do país?
Como “caminhar” com um candidato que está ao lado da Governadora Roseana Sarney, símbolo da miséria e da violência construída no Estado com bem aponta o historiador Wagner Cabral, pois desde a década de 1990 que o panorama socioeconômico do Estado do Maranhão é caracterizado pelos piores índices de desenvolvimento social e humano. Sob o governo de Roseana Sarney, iniciado sob o slogan de um “Novo Tempo”, as medidas ditas de modernização do Estado com investimento industrial, privatizações, reforma administrativa, apoio aos grandes projetos agropecuários trouxeram, ao contrário do propagandeado, aumento e intensificação dos problemas sociais. Como afirma Wagner Cabral (2002, p. 16, grifo do autor) “[...] ao contrário do que os meios de comunicação oficiais afirmam, o desenvolvimento econômico nesse período foi acompanhado pelo crescimento da desigualdade e da injustiça social [...]”.
Ainda segundo Wagner (2002) , respaldado em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Fundação Getúlio Vargas, o Maranhão possuía durante a década de 1990 o maior contingente de miseráveis do Brasil. Dados da saúde, educação, saneamento básico alocavam sempre os últimos lugares ao Estado. Reforçando esta assertiva, Rios (2005, p.101) destaca que:
Na década de 90, o Maranhão experimentou ao longo de sua história, o maior processo de exclusão social, iniciando o século XXI na incômoda posição de último lugar do ranking nacional em diversos setores, entre os quais: falta de água tratada, de rede de esgotos, de coleta sistemática de lixos, renda inferior a dois salários mínimos, analfabetismo, etc., tudo isso associado à falta de investimento na agricultura familiar [...].
Essa realidade mudou? Vai de novo ao Google, por favor, e veja os dados mais recentes!
Como caminhar com um responsável direto pela matança da juventude negra no Maranhão como atestam os Mapas da Violência 2011 e 2012 sobre os Jovens do Brasil coordenados por sociólogos de renome nacional que demonstram o grau de extermínio que passa a juventude negra e pobre, moradora das periferias dos centros urbanos, neste país.
No Maranhão, por exemplo, em 2011, o salto do extermínio da juventude pobre e negra foi brutal – mais de 300% de aumento da violência. O que fica explicito no próprio Mapa da Juventude:
“Observando mais atentamente as Unidades Federadas, ficam evidentes modos de evolução altamente diferenciados, com extremos que vão do Maranhão, Pará ou Ceará, onde os índices decenais se elevam drasticamente” Nesse sentido, a capital do Maranhão, São Luís, sai do 23º lugar em 1998 para o 11º em 2008.
O Número de Homicídios na População de 15 a 24 anos por UF e Região no Brasil de 1998/2008 demonstra que o Maranhão saiu de 1998 de 74 homicídios para 455 homicídios em 2008, ou seja, um aumento alarmante e assustador, principalmente em se tratando da população negra. Em 2012 o quadro ainda é pior!
Além disso, como demonstra também, o professor Hertz Dias em sua dissertação de Mestrado na Universidade Federal do Maranhão , a juventude negra de São Luís tem sido vitimada por um bem elaborado projeto de extermínio que passa pela intensificação da guerra interna na periferia, com inúmeros métodos de potencialização por parte do Estado da violência nos bairros pobre e de maioria negra em São Luís. É com este governo que o “povo negro” está caminhando?
Como justificar as denúncias e provas apresentadas pelo advogado Diogo Cabral da Comissão Pastoral da Terra e da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MA sobre a condição de “barbárie” na qual se encontra o campo maranhense com o extermínio de quilombolas e expulsão de suas terras por comparsas da família Sarney e com a conivência do Estado e do INCRA. Os dados para quem quiser ver estão nos Jornais “Vias de Fato”, mas também estão no Google. Por que será que esses que pertencem ao “povo negro” não conseguem olhar esses dados. Ou será que olham?
Mas podem acusar que Diogo Cabral é um potencial esquerdista ou que o “Vias de Fato” não é isento. Tudo bem? Então o que dizer do protesto na Baía de São Marco do grupo ecologista internacional Green Peace no qual militantes seus se acorrentaram em navios que atracariam no Porto do Itaqui para transportar materiais de empresas situadas no Maranhão que utilizam trabalho escravo, invadem terras indígenas, exterminam esses índios e destroem a natureza. Tudo isso, de novo! Com a conivência do Governo do PT e dos órgãos federais. Mas podem acusar o Green Peace de um grupo militante racial.
Então o que falar da ONG “REPÓRTER BRASIL” que atesta para quem quiser ser honesto que o Maranhão dos Sarneys e do PT é um dos Estados que mais exporta trabalho escravizado no Brasil. Tanto é quem em 2007 diz assim a publicação dessa ONG :
Os dados apresentados [...] indicam os estados com maior número de libertações: Pará, Mato Grosso, Bahia, Maranhão e Tocantins. Podemos considerar que esses estados, por terem grande número de escravos libertados, são os locais onde a exploração acontece com mais frequência. (p. 26)
Invasão do Haiti, desocupação de comunidades negras e quilombolas no Brasil, extermínio da juventude negra, potencialização da guerra interna na periferia pelo Estado, trabalho escravo e assassinatos de quilombolas e indígenas no Maranhão, destruição do meio ambiente... miséria... pobreza...desigualdade...racismo! Esse é o saldo de décadas de dominação da família Sarney agora apoiada e consolidada pelo Partido dos “Trabalhadores”- PT. É esse saldo que o chamado “povo negro” apoia e quer que continue a existir no Estado. Será que esse “povo negro” está preocupado com o povo negro, ou com seus salários comissionados nos gabinetes de parlamentares e do governo?
Será que esse “povo negro” está preocupado com o povo negro, ou com seus privilégios das Secretarias sem orçamento e poder de decisão?
Será que todos os “negros” foram aliados sempre do povo negro? Quem foram os capitães do mato? Será que os mercadores de escravizados eram todos brancos ou havia também “o povo negro” entre esses mercadores? Capitães do Mato e Traficantes negros de escravos, a história se repetindo como tragédia.
É hora de mudar! Quilombo Raça e Classe do Maranhão, nós somos – também – o povo negro e não estávamos naquela fatídica caminhada!
* Rosenverck E. Santos - é professor da UFMA e militante do Movimento Nacional Quilombo Raça e Classe
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